quinta-feira, 26 de maio de 2011

Zé do Parafuso

Nos treinamentos que ministro em empresas menciono algumas histórias que direta e indiretamente fazem alguma alusão aos contextos profissionais de forma geral, do mais simples ao mais elaborado ofício. Esta é possível que você já tenha ouvido por aí.
É a história do ‘Zé do Parafuso’. Diz a lenda que este senhor era um exímio mecânico de máquinas. Consertava tudo, desde liquidificador, até máquinas que valiam milhares de dólares. E como se não bastasse consertar tudo, ainda na maioria das vezes fazia o serviço muito rapidamente. Era um sujeito humilde, simplório, mas muito bom no que fazia. Sua fama corria a boca pequena nas fábricas que se espalhavam pelo país. Sua técnica? Segredo absoluto. Seus instrumentos e equipamentos de trabalho? Nada de excepcional. Uma pequena mala de ferramentas que qualquer ser humano precavido deve ter em casa. Chave de fenda, martelo, grifo. Nada de equipamentos modernos e eletrônicos. Orgulhava-se em dizer que seus equipamentos mais modernos eram seus olhos, ouvidos, mãos e a ‘cabeça que punha para pensar’. 
Eis que uma grande indústria, daquelas que não podem se dar ao luxo de ter um equipamento danificado, passou por um sério apuro. Justamente a máquina mais cara, que produzia as peças mais minuciosas e que era o centro da produção pifou. Nada a fazia funcionar novamente. A tal máquina era importada e depois da visita mal sucedida de três técnicos, um dos funcionários disse: ‘Para arrumar isso aí, só o Zé do Parafuso’. O diretor quis saber de quem se tratava e pediu que o trouxessem imediatamente à fábrica. Zé do Parafuso, também famoso pela sua presteza, chegou ali pouco tempo depois. A expectativa era grande, afinal quase uma centena de homens estava parada e isso significava muito dinheiro perdido. 
Zé do Parafuso chegou e perguntou como havia sido o barulho. Deu a volta na máquina, tocou-a carinhosamente até que seus olhos pararam em uma das engrenagens. Com um sorriso de canto de boca simplesmente agachou, tirou uma chave da mala, apertou um parafuso e ordenou: ‘Liga a danada!’. Diante de homens boquiabertos e nem cinco minutos depois de ter chegado, a ‘danada’ voltou imediatamente a funcionar. O diretor radiante de felicidade, perguntou qual o valor do serviço. Em um segundo a alegria se transformou em indignação e perplexidade. Valor do serviço: 1.000 reais.
Como? Nem cinco minutos de serviço e este caboclo me cobra 1000 reais? Ele está louco! Ao voltar para a sala ainda esbravejando foi ler a nota que discriminava o serviço, escrita em uma folha de caderno toda amassada.
- Ajuste do parafuso = 1,00 real
- Saber qual era o parafuso que deveria ser apertado = 999,00 reais. O diretor então sorriu com a mescla de simplicidade e sabedoria daquele homem.

Costumo contar esta história para salientar a importância de cada um dentro da organização. A ‘expertise’ deve ser valorizada e remunerada de forma justa, de acordo com a qualidade dos profissionais envolvidos. Jamais devemos minimizar a importância ou colocar preço no trabalho dos outros. Quem é bom no que faz deve ser valorizado.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Resiliência

De tempos em tempos alguns termos são tomados por empréstimo e utilizados em segmentos diferentes daqueles de onde se originaram. Um termo em especial, ocupou os últimos anos e foi aplicado insistentemente pela psicologia e pela área de recursos humanos e gestão de pessoas. No contexto corporativo então, foi e ainda é utilizado exaustivamente.
O termo resiliência que na física, de onde foi emprestado, é conceituado como a propriedade de que são dotados alguns materiais, de acumular energia quando exigidos ou submetidos a estresse sem ocorrer ruptura. Este conceito foi redefinindo e incorporado no ambiente empresarial sendo uma habilidade pessoal, a capacidade do indivíduo em responder às situações adversas, problemas, superar obstáculos ou resistir à pressão que estas situações acarretam sem se desestabilizar emocionalmente ou recuperando rapidamente seu equilíbrio. De modo bem coloquial, seria o limiar individual em ‘aguentar o tranco, sem espanar’ e ainda responder positivamente às demandas existentes, característica que é considerada um grande diferencial competitivo.
Neste caso especificamente foi positiva a incorporação deste termo, pois uma série de estudos foi realizado para esmiuçar este conceito e a sua real abrangência no cotidiano das empresas. Ainda assim, talvez uma parte muito relevante tenha passado despercebida. Continuando no campo da física, o limiar de resiliência ainda está ligado aos conceitos relativos à plasticidade e elasticidade e inclui o percentual da energia devolvida após a deformação. Isso mesmo. Além de não ceder às pressões, resiliência diz respeito ao quanto podemos gerar de contrapartida usando exatamente a energia que teoricamente seria a responsável por nosso desgaste. Parou para refletir sobre isto?
Parece incrível, mas resumidamente esta tal resiliência também deve ser considerada justamente a capacidade de tirar dos desafios, das situações desfavoráveis o combustível essencial para seguirmos adiante! 
E é aí que reside a grande questão. Se formos fazer uma avaliação criteriosa, grandes líderes, grandes campeões, grandes ícones da humanidade utilizaram exatamente esta força, que denominamos hoje resiliência, para lutar com mais fervor e conquistar seus objetivos. Quer exemplos? Nelson Mandela, Ayrton Senna, Dalai Lama, Martin Luther King, só para citar alguns. Contudo, para isto é necessária muita competência. Logicamente não falo de competência técnica e sim de competência comportamental. Infelizmente, o que é uma ‘menina dos olhos’ dos gestores e deveria ser um exemplo nos líderes torna-se cada vez mais uma utopia. Fruto natural de líderes que fazem questão de manter a pose, quando na verdade são totalmente despreparados para lidar não apenas com a responsabilidade de seus cargos, mas principalmente demonstram nitidamente a falta de habilidade em lidar com pessoas. 

domingo, 15 de maio de 2011

Você é ‘do ramo’?

Antigamente, era muito comum ao final do anúncio de algum produto ouvir o locutor dizer: ‘Disponível nas melhores casas do ramo’. Hoje este termo caiu em desuso e pode até ser substituído, ainda que não integralmente, por setor, segmento ou área. Mencionei este fato porque em textos anteriores disse que é fundamental fazer o que se gosta, para que tenhamos sempre o tal ‘brilho nos olhos’.
Antes de concluir o raciocínio, foi inevitável que voltasse à minha memória uma história de quando eu era garoto e jogava futebol competitivamente. Tive um técnico, hoje falecido, que era militar. Militar mesmo, tenente do exército. Imagine um tenente treinando crianças para jogar futebol. Pior que saía coisa boa. E fui descobrir bem mais tarde o quanto algumas destas coisas que aprendi eram importantes. 
Mas o fato que quero mencionar acontecia, via de regra, quando algum garoto ia fazer testes, a famosa ‘peneira’ e não passava. Alguns pais, muitos deles tentando concretizar seu próprio sonho através do filho, ficavam irritados e às vezes até grosseiramente interpelavam meu treinador, Sr. Geraldo sobre qual era o motivo da dispensa do filho. Eis que o Sr. Geraldo de modo bem educado e paciente dizia: “Olha, meu senhor, seu filho é um garoto bacana, mas ele não é ‘do ramo’. Talvez ele seja bom em basquete, vôlei, seja um bom desenhista, músico, mas em relação ao futebol, ele não é do ramo”.
Sinceramente achava aquilo duro demais. É possível até que alguns bons jogadores tenham sido equivocadamente avaliados por ele, mas hoje entendo perfeitamente o que ele queria dizer. Não adianta forçar a barra, pois algumas pessoas não combinam com determinadas atividades. Veja bem, acredito que é possível desenvolvermos novas habilidades, novas competências e nos aprimorarmos bastante, mas há algo inato, algo intrínseco que acaba sendo o grande diferencial. 
Imagine o seguinte: Posso tentar aprender a jogar tênis. Certamente desenvolverei habilidades, mas jamais serei um exímio tenista. Posso aprender tocar piano, mas não serei pianista. Dá para perceber a diferença? É aí que reside a grande questão. Tocar piano é diferente de ser pianista. Pessoas que não são do ramo, conseguirão ser na melhor das hipóteses medianas, esforçadas ao realizar seu trabalho. Pode até haver transpiração, o que é importantíssimo, mas dificilmente haverá inspiração, aquilo que diferencia uma pessoa ‘acima da média’ das pessoas comuns naquilo que fazem. 
Seria maravilhoso que cada ser humano tivesse consciência de suas potencialidades, investisse em seus talentos e habilidades e fizesse o que gosta. Infelizmente, o que vemos são pessoas direcionadas por pais ou familiares a seguir um caminho, guiadas unicamente pelo apelo financeiro ou pior, desenvolvendo atividades sem saber o porquê e para as quais não estão motivadas e muito menos capacitadas. 
Contudo, para isso é necessária uma autocrítica imparcial, uma dose extra de sinceridade consigo mesmo e uma coragem interior enorme para realmente admitir que não somos talhados para determinada função. Difícil, não é?