quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Perdas e ganhos

llO título da coluna de hoje é o mesmo título de um livro que li faz muito tempo, de autoria de Lya Luft e que tem como mote central o processo de envelhecimento da mulher e suas peculiaridades.
Neste caso, no entanto, optei pelo título, pois este ‘processo’ de perdas e ganhos permeia a vida de cada um de nós e certamente encarar esta questão com naturalidade e serenidade acaba nos ajudando a sofrer menos e sentirmo-nos mais felizes. 
Vou além. Esta equação perdas/ganhos ocupa um papel de destaque em nossa existência, pois é uma equação que transcende leis matemáticas. Não são diretamente proporcionais. Às vezes perdemos muito e ganhamos pouco. Em outras acontece o contrário.  Em grande parte das situações da nossa vida, para ganharmos algo, temos de ‘perder’ outro algo. Desde as situações mais simples, até nos principais dilemas da vida.
Mas afinal, trata-se de algo simples? A resposta é um sonoro e categórico NÃO. Não é simples porque não gostamos, não somos acostumados a lidar com perdas. Se pudesse optar, o ser humano só ganharia. Também, pelo fato de que quando temos de escolher alguma coisa em detrimento de outra, temos de DECIDIR. E algumas pessoas são extremamente indecisas. E por último, e na minha modesta opinião mais difícil, está naquelas situações onde este processo de perdas e ganhos, ao menos um dos componentes é intangível, abstrato.
Isto acontece, por exemplo, quando estamos ‘trocando’ alguma coisa material por um sonho, um desejo, uma convicção, um sentimento. Está ficando complicado? Calma lá. Uma coisa é ‘perder’ uma reserva financeira para ‘ganhar’ uma casa ou um carro novo. A pessoa disporia de um valor em dinheiro para ter em troca outra coisa. Ambas concretas e tangíveis. Mesmo assim, algumas pessoas hesitam. Sentem-se inseguras em ficar ‘desguarnecidas’ financeiramente.
Entretanto, o pior reside quando trocamos algo ‘palpável’, que está em nossas mãos, por algo que parece ser subjetivo. Por exemplo, quando temos a opção de trocar uma carreira, um salário, que bem ou mal cai na conta no final do mês por um sonho, uma nova oportunidade que traz consigo um número igual de perspectivas e incertezas.
Já passei por algumas situações destas na vida, ultimamente inclusive. E cada vez mais uma coisa fica clara. A dificuldade em mensurarmos esta questão de perdas e ganhos acontece apenas quando não conseguimos dimensionar as nossas próprias capacidades e somos tomados pelos sentimentos de insegurança e incerteza.
Temos de fazer escolhas, isto é inevitável. Porém, nem sempre elas são tão claras para nós. Em qualquer uma delas, ganharemos algo e perderemos algo. Também é inevitável, faz parte do nosso processo de aprendizado e humanização. Como agir então? Pois é também estou aprendendo. E uma das poucas coisas que descobri é que não há perda no mundo capaz de suprir os ganhos que acompanham a sensação de obtermos nossos sonhos e nossa paz de espírito.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

A sogra

Diz uma lenda oriental que há muito tempo, na China, uma moça casou-se e foi viver com o marido e a sogra. Em pouco tempo, a moça percebeu que dificilmente se daria bem com sua sogra. Os temperamentos delas eram muito diferentes e a moça a cada dia ficava mais furiosa com os hábitos de sua sogra. 
Mas, o pior de tudo era que, de acordo com antiga tradição chinesa, a nora tinha que se curvar à sogra e obedecê-la em tudo o que ela desejasse. Este comportamento estava causando ao pobre marido um grande estresse.
Finalmente, não agüentando mais, a moça decidiu tomar uma atitude. Foi ver o Sr. Huang, bom amigo de seu pai, que vendia ervas. Ela lhe falou sobre a situação e pediu que lhe desse algum veneno para resolver o problema de uma vez por todas. O Sr. Huang pensou por algum tempo e finalmente disse:
-Eu ajudarei você a resolver seu problema, mas você tem que me escutar e obedecer a todas as instruções que eu lhe der. O homem entrou no quarto dos fundos e voltou após alguns minutos com um pacote de ervas. Ele explicou:
- Você não pode usar tudo de uma só vez para se libertar de sua sogra, porque isso causaria suspeitas. Eu lhe dou várias ervas que vão lentamente envenenar sua sogra. A cada dois dias prepare alguma carne, de porco ou galinha, e ponha um pouco destas ervas no prato dela. Mas, para ter certeza de que ninguém irá suspeitar de você quando ela morrer, deve ter muito cuidado e agir de forma muito amigável com ela. Não discuta com ela, obedeça-a em tudo e trate-a como se fosse uma rainha.
A moça ficou muito contente. Agradeceu ao Sr. Huang e voltou apressada para casa para começar o projeto de assassinar a sua sogra. O tempo foi passando, e, cada dois dias, a nora servia a comida, especialmente preparada, à sua sogra. Ela se lembrava do que o Sr. Huang tinha dito sobre evitar suspeitas. Assim ela controlou o seu temperamento, obedeceu à sogra, e a tratou como se fosse sua própria mãe. Depois de seis meses, a casa inteira tinha mudado. A moça tinha equilibrado tanto o seu temperamento que quase nunca se aborrecia.
Nestes seis meses, não tinha tido uma discussão com a sogra, que parecia agora muito mais amável e mais fácil de lidar. As atitudes da sogra também mudaram, e ela começou a dizer aos amigos e parentes que a moça era a melhor nora que alguém poderia achar. Elas estavam tratando uma à outra como verdadeiras mãe e filha. 
Um dia, a moça foi ver o Sr. Huang e pediu-lhe ajuda novamente. Ela disse:
- Querido Sr. Huang, por favor, me ajude a evitar que o veneno mate minha sogra! Ela se transformou em uma mulher agradável e eu a amo como minha própria mãe. Não quero que ela morra por causa do veneno que eu lhe dei.
Sr. Huang sorriu e acenou com a cabeça.
- Não há nada com que se preocupar. Eu nunca lhe dei qualquer veneno. As ervas que eu dei a você eram vitaminas para melhorar a saúde dela. O único veneno estava em sua mente e em sua atitude para com ela, mas isso tudo foi jogado fora pelo amor que você deu a ela e pela mudança de perspectiva que isto gerou em ambas.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Wabi Sabi

llWabi Sabi é a expressão que os japoneses inventaram para definir a beleza que mora nas coisas imperfeitas e incompletas. O termo é quase que intraduzível para o português.
De maneira mais concreta, wabi sabi é um jeito de “ver” as coisas através de uma ótica de simplicidade, naturalidade e aceitação da realidade. 
Diz-se que este conceito surgiu por volta do século XV, quando um jovem chamado Sen no Rikyu queria aprender os complicados rituais da Cerimônia do Chá e foi procurar o grande mestre Takeno Joo.
Para testar o rapaz, o mestre mandou que ele varresse o jardim. Rikyu lançou-se ao trabalho feliz. Limpou o jardim e ao terminar, examinou cuidadosamente o que tinha feito: o jardim perfeito, impecável, cada centímetro varrido, cada pedra no lugar, todas as plantas ajeitadas e na mais perfeita ordem.
Contudo, antes de apresentar o resultado ao mestre, Rikyu chacoalhou o tronco de uma cerejeira e fez caírem algumas flores que se espalharam displicentes pelo chão.
Mestre Joo, impressionado, admitiu o jovem no seu mosteiro. Rikyu virou um grande Mestre do Chá e desde então é reverenciado como aquele que entendeu a essência do conceito de wabi sabi:  a arte da imperfeição. É a mesma premissa adotada em relação aos tapetes persas que sempre tem um pequeno defeito, apenas para lembrar a quem olha, de que só Deus é perfeito. 
Esta expressão, wabi sabi, teria muita utilidade se utilizada em nosso dia a dia. Em um contexto de exigência, cobranças e críticas que temos em relação a nós mesmos e aos outros seria um alento se conseguíssemos desenvolver tal maneira de ver as coisas. Esta busca demasiada e sem critérios pela perfeição advém de uma necessidade de adequação a padrões impostos pela sociedade ou por nós mesmos.
O desejo de acertar sempre, a necessidade de estar no controle aumenta a ansiedade e nos impede de evoluir. Há sim beleza e virtude nas coisas imperfeitas, desde que vistas através de uma ótica de simplicidade, naturalidade e aceitação da realidade.
Quantas pessoas passam uma boa parte do tempo sofrendo porque não se sentem adequadas a determinado contexto? Quantos se torturam por não estar enquadrados em certo padrão de beleza? Quantos sofrem preconceitos porque não são exatamente aquilo que é considerado certo ser?
Os reflexos disto podem ser sentidos também nas relações humanas, onde expectativas quase irreais são depositadas nos ombros das pessoas e estas sentem-se obrigadas a cumpri-las e os resultados são quase sempre conflitos, sofrimento, frustração, ansiedade e estresse. 
Os mestres orientais, com a cultura inspirada nos ensinamentos do taoísmo e do zen budismo perceberam que a ação humana sobre o mundo deve ser tão delicada que não impeça a verdadeira natureza das coisas de se revelar. E a natureza é que tudo percorra seu ciclo de nascimento, desenvolvimento e morte, já que todas as coisas são impermanentes, imperfeitas e incompletas. E se não fosse assim, se não fôssemos imperfeitos e tivéssemos a chance de evoluir e melhorar que sentido teria a vida, que é feita de tantas coisas não convencionais?

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Mudar ou inovar?

llDentre os paradigmas mais arraigados da humanidade está o de que o ser humano é resistente a mudanças. Concordo. Em partes. Evolutivamente, quando pensamos em nossos ancestrais e mais recentemente nas gerações passadas, chegamos à conclusão que diversas mudanças foram necessárias para que nos encontrássemos onde estamos hoje.
E uma coisa é inegável. A mudança traz desconforto ao passo que obrigatoriamente nos tira da zona de conforto. Faz com que abandonemos determinada situação para nos inserir em outra. Casos típicos? Mudança de emprego, mudança de casa, mudança de namorado ou namorada, enfim uma infinidade de situações que fazem com que alteremos, às vezes radicalmente, o status quo. Além disso, mudanças normalmente estão atreladas a rupturas, por vezes dolorosas, acontecem quando ‘jogamos fora’ o antigo ou abandonamos algo e principalmente quando temos de partir para algo a que não estamos... acostumados!
Isso mesmo! Talvez o grande dilema da mudança seja tentarmos algo que simplesmente é diferente daquilo que estamos habituados. Perceba, por mais que existam perspectivas promissoras no que é novo, muitas vezes preferimos mantermo-nos atrelados a algo que já conhecemos, por mais que isto já não nos seja mais suficiente. Há outra questão. Não necessariamente uma mudança é uma mudança para melhor.
Então surge a grande pergunta: Se é difícil mudar e não necessariamente a situação atual é satisfatória, como devemos agir? 
A boa notícia é que existe um ponto que talvez seja intermediário entre a mudança completa, que pode nos fazer tomar medidas mais radicais e a por vezes desinteressante opção de ficarmos exatamente como estamos. Este ponto, esta alternativa se chama INOVAR.
Mas existe diferença entre mudar e inovar? Muitas, pode ter certeza. Enquanto mudar significa romper, inovar significa muitas vezes obter uma perspectiva diferente daquilo que já existe. O inovar normalmente está ligado a uma releitura da situação, a potencializar recursos existentes e utilizá-los de modo diferente. Utilizando uma analogia mais simples, mudar seria trocar de casa ou de apartamento, enquanto inovar seria reformar a casa atual dando uma nova cara, uma nova roupagem, uma nova maneira de aproveitar aquilo que já existe. Inovar está ligado à chance de REconstruir um caminho, agregar algo novo àquilo que estamos habituados a fazer. 
Algumas pessoas vivem tentando achar uma rota correta na vida, mudando seus caminhos, mas o problema não está no caminho e sim no viajante, já que muitas vezes as grandes vitórias acontecem não quando mudamos, mas quando conseguimos ver a mesma situação por um prisma diferente. Isto é INOVAR.